
Projeto finalizado. | English version
Este projeto, idealizado e realizado em conjunto com Patrícia Reina, teve como objetivo a criação de um objeto estético experimental como base para a elucidação de conceitos e questões sobre programabilidade. Buscou-se explicitar, por meio da inventividade especulativa e da interpretação crítica, como certos conceitos são conjugados na criação textual.
A partir do conceito de “poder germinativo” enunciado por Pedro Barbosa é possível pensar a centralidade das ideias de latência e potência na programabilidade. Considera-se que a natureza contingencial do código está associada à especificidade do seu contexto de funcionamento, uma vez que determinadas leituras só emergem a partir de certas condições. Aparentemente, esse fato limitaria o papel da criatividade inerente ao processo de leitura. Todavia, ele o viabiliza.
A criação da nossa versão de “texto-objeto-mágico” (Ana Hatherly) vem evidenciar, sobretudo, que o processo de “metaleitura” — ou “leitura criadora” (Ana Hatherly) — se dá em dois níveis, tanto na execução do código quanto na fruição literária do objeto proposto.
O experimento toma por base as palavras que constituem o conto Jack and the beanstalk, para formar composições textuais condicionadas ao poder germinativo dos feijões em que essas palavras foram gravadas à laser. Por sua vez, o poder germinativo das sementes foi condicionado a regas que obedecem a iterações determinadas pelo programa gerador de poemas combinatórios, Poemário, produzido por Rui Torres e Nuno Ferreira.

As palavras escritas nos feijões possuíam estruturas sintáticas específicas: sujeito, verbo, adjunto adnominal (adjetivo) e objeto (substantivo, núcleo do objeto). Para selecionar as palavras que fizeram parte da obra, foram compostas frases contendo elementos da história de Jack and the beanstalk (versão inglesa de Joseph Jacobs, 1890) – personagens, objetos e ações. As frases faziam sentido consoante os eventos da história.
No momento de geração das iterações pelo Poemário, os paradigmas das frases do conto trocam de posição e dão origem a novas construções com novos significados. A partir da geração dessas novas frases, que obedeciam à disposição sintática proposta na conceção do projeto, criava-se um guia de rega, transcodificado em letras e números. Assim, eram regados com 10 mL de água os vasos cujas palavras nos feijões eram selecionadas por este motor gerativo.
A conceção de tal projeto também buscou evidenciar como os atributos objetivos da programabilidade acabam por estabelecer variáveis não-programáveis, tomando por metáfora o cariz projetual da semente e o controle das condições para sua germinação (que poderia ou não corresponder aos resultados de crescimento).
O experimento foi conduzido no MatLit Lab, o laboratório do Programa de Doutoramento em Materialidades da Literatura da Universidade de Coimbra, sendo o primeiro a ter lugar nesse espaço.
Os resultados foram apresentados na conferência “Ana Hatherly: Programabilidade e Criação” e no Colóquio de Matemática e Literatura V, que integrou as atividades do 5º FOLIO (Festival Literário Internacional Óbidos), Portugal, 2019.